Chakanagem by Carl Chaka

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Eu sou como você, da espécie humana, sou capaz de errar. O erro não é falha de caráter e errar faz parte da natureza humana. I am like you, of the human species, I am capable to wander. The mistake is not defective of character and to wander is part of the human nature.

20 dezembro 2006

[Poemas] " Celso Brito "

Meninice

Ah se eu morresse de amor!
Que bonito seria!...
Meu nome, nome de rua.
Meu busto, busto de praça.
Meu coração, amuleto da sorte.

E as moças de nascimentos distantes
- amores mais distantes ainda -
carregadas de flores para o meu funeral.

Os casais e os amantes das noites,
mentindo para uma estrela distante,
na qual puseram o meu nome.

Ah se eu morresse de amor!
Só que sem medo, sem dor,
sem aviso prévio, durante o sono.
E durante pouco tempo.



Noturno

Me cresce da alma feito praga
desdém do dia inútil,
que me sorrir da janela
onde dormem trepadeiras.

O meu Crio em Deus Pai
- que não creio -
rezo ante a beleza
imutável dos altares,
edificados sobre mim.

Copio olhares sem nomes,
ausentes ao momento lírico.
O poema se esfarrapa no ar de horrores.
Um carro cruza sobre mim, a avenida.



Variações do Terceto I

Distante, um vaqueiro
tange o gado.
Mistura-se ao mugido.

Na mira dum caçador
um coelho se esconde...
Sem sorte!

O desenho da fumaça
projeta paz,
atrás do cigarro.

Enclausurado na rocha,
o inseto.
Protege seu veneno.

Cão no borralho,
na sombra um burro.
Coisas nossas!

Mato seco na estrada
Fim da colheita
Pássaros no paiol

Embaixo da mata
corre o riacho.
Desviando-se das pedras.

Seca... cigarra
Vida... vento
Casas vazias

Inútil. A mosca tenta
sem sucesso,
ultrapassar o vidro.

Candeias acesas
Toalhas brancas
Ninguém à mesa



Variações do Terceto II


Pipa solta no horizonte
Linha<------ ----->partida
Brincadeiras do vento

Fim de tarde em Belém.
Chuva de periquitos
na copa das mangueiras.

Um cavalo vigia na sobra
o breve sono do vaqueiro.
É meio dia na fazenda.

Move o dia lento...
Deixa imóvel meu pensamento,
na palha do coqueiro, sem vento.

Chove em Macapá.
Gotas perpendiculares,
na linha do equador.

Imaginário possível:
meu verso convexo transborda.
Água da última chuva.

Galope de burro na estrada.
O bater de asas das rolas pardas,
abrindo passagem.

Revoada no cajueiro
Fim do dia. Silencia.
Periquitos no poleiro.

Chuva na copa da mata.
Vento brincando na estrada,
rouba-me o chapéu.

[Poema] "Da torre de vigília"

Celso Brito


Esse vaga-lume aceso em volta de nós.
Esse olho que espreita nosso gozo,
do fundo escuro do seu tempo.
Esses quintais.
Esses quartéis.
Essas ladeiras.
Esse sol queimando a pele.
O que mais nos resta?

O segredo e a descoberta.
Damos qualquer resposta.
E subimos ao altar,
e nos despimos,
diante dos olhos estarrecidos das imagens,
Nosso nu,
nosso desgraça.
Tamanha desordem...
Os deuses dentro de nós.

No teu olhar um brilho frio de metal.
O vinho tinto que derrama
nos degraus de marfim.
O céu de acrílico que cai
da arquitetura de néon.
E o manto de estrelas que fica
não te acompanha no teu ir.

Um soar descompassado de sino nos anuncia.
E cobre de luto,
o que seria um novo amanhecer.

[Poema] "Antítese"

Celso Brito


Na exatidão
sou a distância maior
entre dois pontos distintos

No sonho
sou o medo daquele
que está sempre acordado
a espreitar o inimigo

Na vida
sou o saltimbanco
que apresenta seu espetáculo
para uma platéia entorpecida

No filme
sou a cena de ação
onde morre o mocinho

Na fuga
sou a distância que separa
o ataque da presa

No amor
sou a semelhança cômica
entre a careta do orgasmo
e a agonia da morte

Na noite
sou a prostituta sem nome
de sexo carnudo
servido a todas

No beijo
sou a boca de homem
com lábios fortes
apertando a alma
sem sentimentos

Na hipótese
sou a dúvida
que desmente a tese
e mantém o problema

No fim
serei poeta
para poder tudo outra vez.

[Poema] "O Nascer das Criaturas"

Celso Brito


Chove, uma neblina perfumada.
Gota a gota escorre,
por entre lábios e pernas.
O sol despeja raios solertes
na pele rósea.
Erguem-se da grama as criaturas.
E a noite cobre o nu
que a natureza contempla.

A aurora encontra vestígios,
que denunciam a partilha.
O tempo segue as pegadas
e fecunda no vão da carne
um pequeno grão de vida.
Cumpre-se a gestação
e da carne irrompe pujante espiga.
Repousa agora o corpo frutificado.

[Poema] "Um certo sertão"

Celso Brito


Contra o mar e a seca, só o sonho.
Nenhuma reflexão cabe a esse fato.
Todas são aflições da alma.

Existe um abismo entre a lágrima e a sua ausência.
Por isso há os que choram,
os que esperam a beira do caminho
e os que cruzam horizontes em busca da brisa.

É inútil esperar pelo mar.
A terra seca sob os pés separa dois mundos.
E essa onda sempre volta,
sem nunca ultrapassar os limites da areia.

O oceano, que daqui um dia se foi, não volta mais.
Fugiu com os navios no caminho do vento,
levando os homens e o coração das mulheres.

Resta essa paciente espera,
mesmo quando não há mais o que esperar.
Sendo assim, não cabe a mim encerrar a história;
embora acredito que queira saber como isso termina.

Um viajante de longe foi quem me disse
da inútil lágrima no mar-oceano.
Ela nada resolve, nada acrescenta ao seu volume.
Mas quem ama sempre volta... acredita no mar.

[Poema] "Cárcere destino"

Celso Brito.


Quando a tive sob meu julgamento,
condenei-me pelo crime que havia no olhar.

Seus gestos de quase nunca
denunciaram a culpa.
a minha?...
a dela?...

- Desconhecida era a pena.

Ordenei-lhe a fuga.
Resistiu, pois sabia de mim.

Vieram as perguntas.
As fiz em outro tempo
em resposta ao seu corpo.

- Desconhecido também era o tempo.

Conjugavam-se o ontem e o agora,
o futuro ainda não existia.

Confessei os feitiços,
o arder das chamas,
o verbo aliciado pela carne desde o princípio.

A mim não coube recurso. Culpado.
Mantive-me prisioneiro do cárcere destino,
sob vigília,
para evitar a fuga.

Quando a tive sob meu julgamento,
condenei-me ao eterno amar.

13 dezembro 2006

[Poema] "O Que Mais Dói"

Patativa do Assaré


O que mais dói não é sofrer saudade
Do amor querido que se encontra ausente
Nem a lembrança que o coração sente
Dos belos sonhos da primeira idade.

Não é também a dura crueldade
Do falso amigo, quando engana a gente,
Nem os martírios de uma dor latente,
Quando a moléstia o nosso corpo invade.

O que mais dói e o peito nos oprime,
E nos revolta mais que o próprio crime,
Não é perder da posição um grau.

É ver os votos de um país inteiro,
Desde o praciano ao camponês roceiro,
Pra eleger um presidente mau.

[Poema] "Seu Dotô Me Conhece?

Patativa de Assaré.

Seu dotô, só me parece
Que o sinhô não me conhece
Nunca sôbe quem sou eu
Nunca viu minha paioça,
Minha muié, minha roça,
E os fio que Deus me deu.

Se não sabe, escute agora,
Que eu vô contá minha história,
Tenha a bondade de ouvi:
Eu sou da crasse matuta,
Da crasse que não desfruta
Das riqueza do Brasil.

Sou aquele que conhece
As privação que padece
O mais pobre camponês;
Tenho passado na vida
De cinco mês em seguida
Sem comê carne uma vez.

Sou o que durante a semana,
Cumprindo a sina tirana,
Na grande labutação
Pra sustentá a famia
Só tem direito a dois dia
O resto é pra o patrão.

Sou o que no tempo da guerra
Contra o gosto se desterra
Pra nunca mais vortá
E vai morrê no estrangêro
Como pobre brasilêro
Longe do torrão natá.

Sou o sertanejo que cansa
De votá, com esperança
Do Brasil ficá mió;
Mas o Brasil continua
Na cantiga da perua
Que é: pió, pió, pió...

Sou o mendigo sem sossego
Que por não achá emprego
Se vê forçado a seguí
Sem direção e sem norte,
Envergonhado da sorte,
De porta em porta a pedí.

Sou aquele desgraçado,
Que nos ano atravessado
Vai batê no Maranhão,
Sujeito a todo o matrato,
Bicho de pé, carrapato,
E os ataques de sezão.

Senhô dotô , não se enfade
Vá guardando essa verdade
Na memória, pode crê
Que sou aquele operário
Que ganha um nobre salário
Que não dá nem pra comê

Sou ele todo, em carne e osso,
Muitas vez, não tenho armoço
Nem também o que jantá;
Eu sou aquele rocêro,
Sem camisa e sem dinhêro,
Cantado por Juvená.

Sim, por Juvená Galeno,
O poeta, aquele geno,
O maió dos trovadô,
Aquele coração nobre
Que a minha vida de pobre
Muito sentido cantou.

Há mais de cem ano eu vivo
Nesta vida de cativo
E a potreção não chegou;
Sofro munto e corro estreito,
Inda tou do mermo jeito
Que Juvená me deixou.

Sofrendo a mesma sentença
Tou quase perdendo a crença,
E pra ninguém se enganá
Vou deixá o meu nome aqui:
Eu sou fio do Brasil,
E o meu nome é Ceará.

[Estudo] "Patativa do Assaré"

Relações entre Estética, Hermenêutica, Religião e Arte
[Por:] Cristiane Moreira Cobra

Resumo

Este trabalho é fruto de uma pesquisa bibliográfica e teórica sobre a poesia de Patativa do Assaré; constata que o discurso poético constituído em sua obra aponta para elaboração de uma forma de contestação e resistência diante das desigualdades vivenciadas pelo seu grupo, que toma por referência a religiosidade cristã popular. Como elementos dessa poética resistente ressaltamos a memória, a oralidade, a ressignificação de conceitos instituídos pela ortodoxia da Igreja, bem como a abordagem de temas pertinentes aos membros desse grupo. A interpretação analítica dos poemas tem como referências a teoria literária de Alfredo Bosi. Patativa recorre ao imaginário religioso cristão católico como fonte de sentido e significado, revelando formas típicas à Cultura Popular de compreensão da religiosidade.

Palavras-chave: Patativa do Assaré; Ressignificação; Hermenêutica; Resistência.

Abstract
This article is the result of a bibliographic and theoretical research about Patativa do Assaré´s poetry. It ascertains that the poetical discourse present in his work indicates the elaboration of contention and resistance concerning the inequality lived by his group, which uses the popular Christian religiosity as reference. The memory, orality, re-signification of concepts instituted by the Church´s ortodoxy as well as the approach of pertinent themes to the members of this group are emphasized as elements of his resistent poetry. The analytical interpretation of the poems is based on the literary theory of Alfredo Bosi. Patativa makes use of the Christian Catholic religious imaginary as source of sense and meaning. He reveals to the popular culture typical forms of understanding the religiosity.

Key words: Patativa do Assaré; Re-signification; Hermeneutics; Resistance.

1. Introdução

A Literatura Popular, rica em seu macrocosmos variado de autores, temas e obras, revela-se também riquíssima no microcosmo de cada um de seus autores, sendo hoje amplamente reconhecida e divulgada na pessoa do poeta Antônio Gonçalves da Silva, o Patativa do Assaré, personagem chave do panteão nordestino[1]; homem do sertão, agricultor pobre que passou por poucos meses de contato com o aprendizado escolar e que é considerado aqui sob o signo de poeta e artesão da linguagem[2], autor de uma obra consistente e reconhecida, emblemática da Literatura Popular nordestina[3] e nacional. Sua poética marcada pela oralidade constitui-se como voz que posteriormente fez-se letra[4]; foi, originalmente um artesão da palavra falada, narrador performático de improvisos versificados numa linguagem matuta.

Neste estudo, situamos resumidamente o contexto do poeta e de sua Literatura Popular, como se constitui seu discurso poético, sua estética e sua hermenêutica populares, além dos elementos de resistência e contestação presentes na poética de Patativa, como ele descreve e dialoga com a religiosidade popular e como reelabora o conceito de Divina Providência. Patativa recorre ao imaginário religioso cristão católico como fonte de sentido e significado; entretanto revela-se sua elaboração popular de tais elementos como presença marcante da religiosidade do povo nordestino e brasileiro. Conforme o aporte teórico de Alfredo Bosi, é preciso debruçar-se sobre a obra do poeta, iluminando-a sob a luz da história da consciência humana, que não é estática e nem mesmo homogênea.[5] Considerar o contexto do poeta, sua relação com a História Geral, bem como a história particular imanente e operante em cada um de seus poemas; repensando o conceito de historicidade dessa obra poética, derrubando cronologismos apertados e relacionando poesia e sociedade.

Segundo Alfredo Bosi, o poema é uma expressão poliédrica, herdada e inventada, pela qual o poeta enfrenta a rotina retórico-ideológica da sociedade usando livremente instrumentos da própria tradição e é preciso reconhecer o sim e o não em todas as coisas.[6] Nosso objetivo é, a partir da palavra poética, compreender as relações entre produção literária, religiosidade, imaginário e cultura; para então: aprofundar o conhecimento a respeito da obra poética de Patativa do Assaré, compreender as formas populares de reelaboração e ressignificação do imaginário católico e discutir a hipótese de que a poesia de Patativa e seus elementos da Cultura e Religiosidade Popular caracterizem fator de resistência.

Se todo discurso revela uma forma de ver o mundo e de interpretá-lo, pois através da palavra atribuímos sentido e significado a esse mundo, no caso do discurso poético de Patativa o sentido é dado pela relação com a natureza e com a religiosidade popular, que é o ponto focal de nosso interesse. Sob a ótica das Ciências da Religião, aprofundar a análise dessa obra, possibilita ampliar o conhecimento sobre a Literatura Popular no Brasil, enquanto manifestação artística, e suas relações com a religiosidade e a cultura.

Segundo Foucault, a Linguagem constitui teias de significado que operam em todos os âmbitos da vida.[7] Roland Barthes afirma que a fala se constitui como uma forma de organização pessoal e implica sempre em exercício de poder.[8] Sendo a Literatura Popular, uma Linguagem própria que evoca significados e também caracteristicamente oral (fala), deve considerar-se que, portanto implica exercícios de poder. O principal autor tomado como referência teórica é Alfredo Bosi, principalmente por sua consideração (conceituação) da poesia como uma forma de resistência; ele afirma que o poeta é caracterizado como o doador de sentido, mas que no mundo moderno ocorre uma cisão, restando à poesia o papel de aguçar a consciência dessa contradição do sentido, pois não se integra mais aos discursos correntes na sociedade. De acordo com Bosi, o poema pode ter o papel de acender no homem, ou de revelar, o inconsciente desejo de uma outra existência, mais livre e mais bela e, sendo assim, a poesia traduz em sons e símbolos essa realidade pela qual ou contra qual vale a pena lutar.

2. Contexto de uma poética: Literatura de Folhetos Nordestina
Segundo Márcia de Abreu, a Literatura de folhetos Nordestina pode ser considerada uma das expressões populares mais brasileiras que existem, marcadamente comuns na região Nordeste e naquelas regiões que abrigam os migrantes de origem nordestina. Com as grandes navegações aportaram no Brasil trovadores e artistas populares, que trouxeram em sua bagagem cultural o que alguns consideravam ser as origens dessa literatura, porém no Brasil a Literatura Popular desenvolveu temáticas próprias e hoje ultrapassa um século de história.[9] Trata-se de uma Literatura dinâmica e flexível, que atinge os mais diversos temas, com objetivos múltiplos e vasta divulgação e aceitação social, tanto em meios populares, como nas elites acadêmicas. O folheto é um veículo popular de participação na vida do país, que permite ao povo debater a realidade, expressar suas necessidades e aspirações.[10] Apesar de serem impressos, no entanto, os folhetos caracterizam-se por sua tradição oral, suas marcas de oralidade e o fato de serem feitos para serem declamados, lidos ou cantados em voz alta para um grande número de pessoas, mesmo as analfabetas; características comuns às culturas que valorizam a oralidade, segundo Paul Zumthor.[11]

No Brasil, infelizmente, a Literatura Popular em verso foi, por muitos anos, mal compreendida e interpretada, excluída dos estudos oficiais de literatura, permanecendo em desconhecimento por longo período. Como principais motivos da demora no reconhecimento e inclusão dessa modalidade literária nos estudos oficiais, Joseph M. Luyten levanta alguns problemas históricos como a introdução tardia da imprensa no país, que foi o último das Américas a dispor desse recurso, e a excessiva imitação de modelos estrangeiros pela intelectualidade.[12] O início dessa manifestação literária no Brasil remonta a fins do século XIX e conta hoje com maciça bibliografia crítica e uma vasta produção de folhetos e autores que constituem um panorama das influências dessa poética popular em nossa cultura.

A questão da especificidade da produção dessa Literatura no Brasil, mais especificamente no Nordeste do país, toma corpo com a nova hipótese explicativa levantada pela pesquisadora Márcia Abreu que propõe um confronto entre o Cordel português e a Literatura de Folhetos Nordestina visando, a partir da apresentação da trajetória histórica e da comparação dos textos, discutir a independência entre essas duas formas literárias.[13] A autora aponta para o equívoco da hipótese de uma associação ou decorrência entre Literatura de Cordel portuguesa e Literatura de Folhetos do Nordeste brasileiro; questiona ainda o uso do termo Literatura Popular como sinônimo de cordel, já que tanto os autores quanto o público dessa literatura não pertence exclusivamente às camadas populares.[14] Através de um esmiuçado levantamento do trajeto histórico do Cordel português, Márcia conclui pela completa ausência de unidade dessa produção, que inclui textos em verso, em prosa, de gêneros variados, produzidos e consumidos por camadas amplas da população, não somente as populares.[15] Salienta ainda que a possível característica de uniformidade dessa produção não inclui o texto, nem os autores e nem mesmo o público; somente a materialidade do cordel, sua aparência e seu preço.[16]

A longevidade de um corpus literário é, quase sempre, maior do que a do suporte gráfico por meio do qual é divulgado; isso ocorreu da mesma forma com o romanceiro popular nordestino, que já existia muito antes da imprensa em folhetos.[17] A base de subsistência do romanceiro popular nordestino, anteriormente ao registro escrito no século XIX, constituía-se pela conjunção entre memória e oralidade; sendo que os primeiros manuscritos compunham os cadernos pessoais de poetas, com versos próprios e de grandes mestres, que podiam ser vendidos ou trocados eventualmente.[18] A Literatura Popular Nordestina constitui um corpus específico, não pelo formato gráfico dos folhetos, mas por sua especificidade de gênero literário construído na e pela oralidade conjugada à memória. A principal característica que garante especificidade aos Folhetos Nordestinos é a rigidez de regras quanto à rima, à métrica e à estruturação do texto, sendo que essas regras são conhecidas pelos autores e também pelo público; e como afirma a pesquisadora Márcia Abreu, essa rigidez da forma parece ser uma criação brasileira, já que em Portugal não existe essa uniformidade nas produções.[19]

Patativa, por sua vez, nasce, cresce e se torna poeta em meio a essas influências referentes à rima, métrica e oração características desse corpus literário nordestino, traduzindo em seus versos características de repentista, cantador, autor de improvisos livres ou baseados em motes, além de produzir também poemas encomendados, com temática definida, e, posteriormente aos tradicionais folhetos, publicar inúmeros livros, gravar LPs, entrevistas no rádio e na televisão e fazer ecoar sua poesia através de diversos mídia.

3. Antonio: o despertar do poeta Patativa
Antônio, como era chamado o poeta, segundo filho do casal de agricultores Pedro Gonçalves da Silva e Maria Pereira da Silva, nasceu no dia 5 de março de 1909 e viveu sua meninice no sítio dos pais, distante três léguas da vila de Assaré, ao sul do Ceará; vivenciando desde menino as agruras do trabalho com a terra no nordeste seco.[20] Na época o estado do Ceará contava com oitenta e dois municípios, dos quais vinte e oito cidades e cinqüenta e quatro vilas; Assaré era uma dessas vilas desde 1865, quando se desmembrou de Saboeiro.[21] É interessante salientar que Assaré, etimologicamente, significava atalho, antigo desvio do caminho das boiadas dos Inhamuns para o Piauí[22]; e também para o poeta Patativa seria um atalho para o mundo, um acesso rápido à universalidade da experiência humana da existência.

Nas biografias do poeta, é marcantemente narrado o infeliz fato de sua cegueira, decorrente da combinação de duas doenças que o acometeram por volta de um ano de idade, segundo alguns pesquisadores, ou até por volta dos quatro anos segundo outros[23]. A seqüela, apesar de marcada pela negatividade, acabou sendo posteriormente associada a características de outros grandes poetas, entre os quais Homero e o violeiro cego Aderaldo; ou associada a Camões pelo próprio Patativa. O mundo do menino Antônio era a Serra, Serra de Santana, na qual o lazer era contemplar a paisagem e brincar com os cinco irmãos, além do constante trabalho na roça; em sua memória da infância, porém, impregnou-se a visão performática de violeiros e versejadores repentistas, os quais presenciou ainda criança e almejou um dia aventurar-se a imitar.[24]

Apesar da visão bucólica de sua própria infância, as análises constituídas sobre o poeta e sua obra revelam indícios da forte influência do mundo adulto na formação de sua personalidade, o trabalho precocemente presente e o pouco contato com crianças de sua idade corroboraram a construção dos sentidos e valores de sua vida e, conseqüentemente, de sua poética. Sem determinar por completo ou delimitar diretamente caminhos pré-concebidos unicamente pela tradição, Patativa revela sua individualidade ao reelaborar essa visão adulta do mundo e transcrevê-la em sua poética, sem, contudo, negar sua infância.[25] Seu período de freqüência escolar foi mínimo, apenas alguns meses, segundo ele próprio, quando já tinha doze anos; aprendeu usando os livros de Felisberto Rodrigues Pereira de Carvalho; adiantou-se na leitura dos livros, que deveriam ser usados durante dois anos, mas foram facilmente devorados em meses, abrindo acesso à cultura escrita para o sagaz leitor.

Patativa vive um período de mudanças dos oito aos dezesseis anos, durante o qual começa a fazer poesias antes de ser alfabetizado e a cantar viola antes de ter seu próprio instrumento, interessa-se pelos folhetos, mas não sabe ler ainda, arrisca versos enquanto brinca de caçadas com bodoque. Alguns pesquisadores consideram essa fase de hesitações coincidente com o momento em que Patativa ganha sua própria viola, de presente de sua mãe, e passa a entusiasmar-se com as cantorias e convites para apresentações.[26] Pesquisadores como Gilmar de Carvalho consideram que a vocação poética de Patativa teve origem já na infância, no lazer de contemplação da natureza, bem como nas participações de leituras coletivas de folhetos de cordel, de ponteios de viola e de pelejas[27]; a partir dessas experiências contemplativas da beleza, natural e cultural, descobriu a possibilidade da criação própria e do improviso de versos.

4. Versos: estética, ética e hermenêutica, a arte no sertão
Percebemos nos poemas de Patativa a constituição de um eu-poético esteta contemplativo que admira a natureza e percebe o mundo através dos sentidos, revelado em versos como os que se seguem:

ABC NEM BEABÁ
no meu livro não se incerra.
O meu livro é naturá
é o má, o céu e a terra,
cum a sua imensidade.
Livro cheio de verdade,
de beleza e de primô,
tudo incadernado, iscrito
pelo pudê infinito
do nosso Pai Criadô.[28]

Inúmeros outros poemas de Patativa confirmam sua admiração contemplativa pela natureza, sua percepção do livro da natureza, considerando sempre a autoria divina desse registro de beleza e verdade.

Paralelamente a um eu-poético hermeneuta intérprete do mundo que o traduz numa linguagem poética popular, apresentando significados próprios para realidade vivida, como percebemos nos versos a seguir:

CANTE LÁ, QUE EU CANTO CÁ
Poeta, cantô da rua,
Que na cidade nasceu,
Cante a cidade que é sua,
Que eu canto o sertão que é meu.
(...)
Você é munto ditoso,
Sabe lê, sabe escrevê,
Pois vá cantando o seu gozo,
Que eu canto meu padecê.
Inquanto a felicidade
Você canta na cidade,
Cá no sertão eu infrento
A fome, a dô e a misera.
Pra sê poeta divera,
Precisa tê sofrimento.
Sua rima, inda que seja
Bordada de prata e de oro,
Para a gente sertaneja
É perdido este tesôro.
Com o seu verso bem feito,
Não canta o sertão dereito,
Porque você não conhece
Nossa vida aperreada.
E a dô só é bem cantada,
Cantada por quem padece.
(...)
Canto as fulô e os abróio
Com todas coisa daqui:
Pra toda parte que eu óio
Vejo um verso se bulí.
Se as vez andando no vale
Atrás de curá meus male
Quero repará pra serra,
Assim que eu óio pra cima,
Vejo um diluve de rima
Caindo inriba da terra.
Mas tudo é rima rastêra
De fruita de jatobá,
De fôia de gamelêra
E fulô de trapiá,
De canto de passarinho
E da poêra do caminho,
Quando a ventania vem,
Pois você já tá ciente:
Nossa vida é deferente
E nosso verso também(...)[29]

Em sua hermenêutica popular, o poeta reinventa os modos de ser do povo sertanejo nordestino, propõe novos modos de viver e ordena través de sua linguagem poética todas as coisas e o mundo; na fluidez de seus versos doa sentidos à realidade.

Além desses, Patativa revela um eu-poético artista que percebe, reinterpreta e cria, experimentando a emoção estética de produzir sentido e fazer de todo e qualquer objeto, um objeto artístico, como no trecho do poema que segue

O INFERNO, O PURGATÓRIO E O PARAÍSO
Pela estrada da vida nós seguimos,
Cada qual procurando melhorar,
Tudo aquilo, que vemos e que ouvimos,
Desejamos, na mente, interpretar,
Pois nós todos na terra possuímos
O sagrado direito de pensar,
Neste mundo de Deus, olho e diviso
O Purgatório, o Inferno e o Paraíso.
Este Inferno, que temos bem visível
E repleto de cenas de ternura, (sic)
Onde nota-se o drama triste horrível
De lamentos e gritos de loucura
E onde muitos estão no mesmo nível
De indigência, desgraça e desventura,
É onde vive sofrendo a classe pobre
Sem conforto, sem pão, sem lar, sem cobre.
(...)
Mas acima é que fica o Purgatório,
Que apresenta também sua comédia
E é ali onde vive a classe média.
Este ponto também tem padecer,
Porém seus habitantes é preciso
Simularem semblantes de prazer,
Transformando a desdita num sorriso.
E agora, meu leitor, nós vamos ver,
Mais além, o bonito Paraíso,
Que progride, floresce e frutifica,
Onde vive gozando a classe rica.
Este é o Éden dos donos do poder,
Onde reina a coroa da potência.
O Purgatório ali tem que render
Homenagem, Triunfo e Obediência.
Vai o Inferno também oferecer
Seu imposto tirado da indigência,
Pois, no mastro tremula, a todo instante,
A bandeira da classe dominante.
(...)
Já mostrei, meu leitor, com realeza,
Pobres, médios e ricos potentados,
Na linguagem sem arte e sem riqueza.
Não são versos com ouro burilados,
São singelos, são simples, sem beleza,
Mas, nos mesmos eu deixo retratados,
Com certeza, verdade e muito siso,
O Purgatório, o Inferno e o Paraíso.[30]


Percebemos nesses trechos de versos, como em muitos outros poemas de Patativa, a valorização da vida, restauração de valores humanitários, da religiosidade e de uma consciência crítica diante da realidade inóspita de nossa sociedade desigual; para além da importância artística e criativa desse poeta do sertão, a universalidade de sua poética se deve certamente ao conteúdo ético presente em seu discurso.

5. Considerações finais
Segundo Alfredo Bosi, a linguagem poética é um dos aspectos da Literatura sobre o qual pesa, ainda mais, o caráter de complexidade e de múltiplas relações de interdependência com o contexto histórico. Segundo ele, a poesia não se integra nos discursos correntes da sociedade[31], permanecendo sob formas estranhas e sobrevivendo mesmo nesse meio hostil; afirma ainda que a poesia pode representar resistência sob variadas formas, seja através de sua forma mítica, de um lirismo de confissão ou de sátira, paródia, utopia.[32]

Bosi supõe vários caminhos de resistência poética, entre os quais o da poesia mítica[33] como aquela que responde ao presente ressacralizando a memória como base da infância recalcada, na qual as figuras da infância e da tradição assumem sentido encantador, proporcionando o reencontro do adulto com o mundo mágico da criança. E, ao deparar-nos com versos de Patativa, como não reconhecê-lo um, também, poeta mítico que proporciona o encontro com o mundo mágico da criança nordestina?[34] Como poesia mítica, a obra de Patativa se enquadra, pois recupera figuras e sons[35], faz-se poesia da natureza e da saudade, revelando o poeta como uma consciência que se volta para aquilo que não é, ainda, consciência[36]; ao falar da natureza, das plantas[37] e dos bichos como o Jumento [38], dos maquinários, das ferramentas[39], de algum pássaro ou outro animal[40], Patativa se mostra um representante dessa poesia mítica, marcada pela resistência ao tempo do domínio e do cálculo no qual vivemos.[41]

Através da definição de poesia sátira, épos revolucionário e poesia utópica[42] propostas também por Alfredo Bosi, é possível analisar e perceber também afinidades com a poética de Patativa do Assaré. Nessa linhagem da poesia, segundo o autor, o modo de resistência preferido é o ataque, no qual o poeta-profeta busca atingir diretamente as circunstâncias de seu momento[43], vivendo uma constante tensão, recusando seu presente e, apresentando através da imagem e do desejo, uma invocação ao futuro aberto de possibilidades.[44] Patativa como poeta-profeta revela em seus versos o agora, de seu tempo, mas move-se na direção do ainda não, como antecipação do novo tempo, de um futuro utópico.[45] No entanto, somente o contexto da obra poética pode ajudar-nos a decifrar se essa crítica- sátira é conservadora ou realmente revolucionária, se essa palavra poética clama ao passado ou ao futuro; e qual a relação proposta entre recusa e utopia.[46]

Segundo Bosi, o lugar de onde se move uma autêntica sátira-crítica constitui-se como um topos negativo, caracterizado pela recusa aos costumes, à linguagem e ao modo de pensar corrente.[47] E, nesse ponto exatamente, como não identificar de imediato a poesia de Patativa como um discurso que ecoa a partir de um topos negativo?; que critica novos costumes e valoriza a moral tradicional, que se coloca numa linguagem totalmente própria e singular como representante de um grupo ou classe definida e que recusa o modo de pensar e agir correntes em seu tempo e crê num novo tempo. Nos diversos poemas de Patativa é possível notar características desse topos negativo, seja ao comentar de modo crítico os costumes modernos, que contrariam a moral tradicional, seja através de sua linguagem matuta, marcada pela oralidade, ou ainda ao criticar diretamente o modo de pensar de seus contemporâneos, através da poesia.

A forma de contestação que transparece na poética de Patativa varia, desde manifestações de uma poesia mítica e de uma sátira crítica, até culminar em uma poesia utópica e profética; relevante para a reflexão a que se propõe esse estudo, no entanto, é considerar que todas essas variantes presentes na obra poética de Patativa traduzem certa resistência através do discurso. Sendo resistência um conceito originariamente ético e não estético, segundo Alfredo Bosi, adotar esse termo exige-nos certa cautela; a resistência na narrativa, segundo Bosi, comumente surge como tema ou como processo inerente à escrita.[48] Em Patativa, a resistência revela-se nos temas, bem como na tessitura da escritura de seus poemas, no uso da linguagem como demonstração e valorização de uma condição de classe. Intuição e desejo fundamentam a arte poética de Patativa sem, entretanto, inibirem a força cognitiva de sua compreensão de mundo e de sua vontade ética, extremamente consciente dos critérios da realidade sertaneja e dos ditames da coerência entre sua condição de sertanejo e de sua libido de poeta. Enfocar os elementos de resistência incutidos na poética de Patativa implica considerar um objeto estético sob aspectos éticos; fruto da libido artística que envolve intuição e desejo a poesia enquanto discurso traduz em si também uma visão de mundo baseada em certos valores e princípios éticos.

Bibliografia
ABREU, Márcia de. Histórias de cordéis e folhetos. Campinas: Mercado das Letras/Associação de Leitura do Brasil, 1999.

ANDRADE, Cláudio Henrique Sales. Patativa do Assaré: as razões da emoção (capítulos de uma poética sertaneja). Fortaleza: Editora UFC / São Paulo: Nankin Editorial, 2003.

ASSARÉ, Patativa do. Aqui tem coisa. São Paulo: Hedra, 2004.

ASSARÉ, Patativa do. Cante lá que eu canto cá: Filosofia de um trovador nordestino. 8ª ed., Petrópolis: Vozes/Crato: Fundação Pe. Ibiapina, 1992.

ASSARÉ, Patativa do. Ispinho e fulô. Fortaleza, Secretaria de Cultura, Turismo e Desporto/Imprensa Oficial do Ceará, 1988.

ASSARÉ, Patativa do. Patativa do Assaré: uma voz do Nordeste. Int. e seleção Sylvie Debs, São Paulo: Hedra, 2000.

BARTHES, Roland. O prazer do texto. 3ª ed.,Coleção Elos, São Paulo: Editora perspectiva, 2002.

BOSI, Alfredo. O ser e o tempo da poesia. 6ª ed., São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

CARVALHO, Gilmar de. Patativa do Assaré. 3ª ed., Fortaleza: Edições Demócrito Rocha, 2001.

CURRAN, Mark J. História do Brasil em Cordel. 2ª ed., São Paulo: EDUSP, 2003.

DIÉGUES JR, Manuel e outros. Literatura popular em verso: estudos. Belo Horizonte: Itatiaia/São Paulo: EDUSP/Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa, 1986.

FEITOSA, Luiz Tadeu. Patativa do Assaré: a trajetória de um canto. São Paulo: Escrituras Editora, 2003.

FOUCAULT, Michel. As Palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas. Trad.: Salma Tannus Muchail, 8ª ed., São Paulo: Martins Fontes, 1999.

HELENA, Raimundo Santa. Raimundo Santa Helena. Introdução e seleção: Bráulio Tavares, São Paulo: Hedra, 2003. (Biblioteca de Cordel)

MENEZES, Adélia Bezerra de. Desenho Mágico: Poesia e política em Chico Buarque. 2ª edição, São Paulo: ATELIÊ EDITORIAL, 2000.

ZUMTHOR, Paul. Performance, recepção, leitura. Tradução de Jerusa Pires Ferreira e Suely Fenerich. São Paulo: EDUC, 2000.

Notas
[*] Mestre em Ciências da Religião pela PUC-SP.

[1] ASSARÉ, Patativa do. Patativa do Assaré: uma voz do Nordeste, 2000.
[2] Signo atribuído ao cantor e intelectual Chico Buarque por MENEZES, Adélia Bezerra de. Desenho Mágico – Poesia e política em Chico Buarque, p.17.
[3] Interessante distinção entre cordel e literatura popular nordestina é elaborada na obra de ABREU, Márcia de. Histórias de cordéis e folhetos, 1999.
[4] Visando compreensão dos conceitos de performance, letra e voz, leitura introdutória da obra de ZUMTHOR, Paul. Performance, recepção, leitura, 2000.
[5] BOSI, Alfredo. O ser e o tempo da poesia, 2000, p.13.
[6] Idem, p.15.
[7] FOUCAULT, Michel. As Palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas, 1999.
[8] BARTHES, Roland. O prazer do texto, 2002.
[9] ABREU, Márcia de. Histórias de cordéis e folhetos, 1999.
[10] Visando ampliação dos conhecimentos a respeito do Cordel e do poeta Patativa, como leitura introdutória, indico as obras:
CARVALHO, Gilmar de. Patativa do Assaré. 3ª ed., Fortaleza: Edições Demócrito Rocha, 2001.
CURRAN, Mark J. História do Brasil em Cordel. 2ª ed., São Paulo: EDUSP, 2003.
DIÉGUES JR, Manuel e outros. Literatura popular em verso: estudos. Belo Horizonte: Itatiaia/São Paulo: EDUSP/Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa, 1986
[11] ZUMTHOR, Paul. Performance, recepção, leitura. Trads. Jerusa Pires Ferreira, Suely Fenerich. São Paulo: EDUC, 2000.
[12] Afirmações encontradas no prefácio de Joseph M. Luyten à obra de ASSARÉ, Patativa do. Patativa do Assaré uma voz do nordeste, 2000.
[13] ABREU, Márcia de. Histórias de cordéis e folhetos, p.12.
[14] Idem, p.22-23.
[15] Ibidem, p.46.
[16] Ibidem, p.48.
[17] HELENA, Raimundo Santa. Raimundo Santa Helena, p.30.
[18] Idem, p.31.
[19] ABREU, Márcia de. Histórias de cordéis e folhetos, p.108.
[20] Informações colhidas em diversas de suas biografias, entre as quais no livro de ANDRADE, Cláudio Henrique Sales. Patativa do Assaré: as razões da emoção (capítulos de uma poética sertaneja), 2003, p.25.
[21] CARVALHO, Gilmar de. Patativa do Assaré, p.10.
[22] Idem, p.11
[23] Ibidem, p.13.
[24] Ibidem, p.14.
[25] FEITOSA, Luiz Tadeu. Patativa do Assaré: a trajetória de um canto, 2003, p.100.
[26] ANDRADE, Cláudio Henrique Sales. Patativa do Assaré: as razões da emoção (capítulos de uma poética sertaneja), p.31.
[27] CARVALHO, Gilmar de. Patativa do Assaré. p.14-15.
[28] ASSARÉ, Patativa do. Ispinho e fulô, 1988, p.67.
[29] ASSARÉ, Patativa do. Cante lá, que eu canto cá: filosofia de um trovador nordestino, p.25-29.
[30] ASSARÉ, Patativa do. Cante lá que eu canto cá: Filosofia de um trovador nordestino, pp.43-47.
[31] BOSI, Alfredo. O ser e o tempo da poesia. 6ª ed., São Paulo: Companhia das Letras, 2000, p.165.
[32] Idem, p.166.
[33] Ibidem, p.174.
[34] Ibidem, p.176.
[35] Ibidem, p.179.
[36] Ibidem.
[37] Poemas como “Eu e o Sertão”, “O paraíso do Crato”, “A festa da natureza” e “A terra é Naturá” contidos na obra de ASSARÉ, Patativa do. Cante lá, que eu canto cá: filosofia de um trovador nordestino, 1992.
[38] Poemas como “Meu caro jumento” e “O Burro”, contidos na mesma obra citada anteriormente.
[39] Poemas como “Minha impressão sobre o trem de ferro” e “Minha vingança”, contidos na obra de ASSARÉ, Patativa do. Aqui tem coisa, 2004. E também os poemas “Ingém de Ferro” e “O puxadô de roda”, contidos na obra de ASSARÉ, Patativa do. Cante lá, que eu canto cá: filosofia de um trovador nordestino, 1992.
[40] Poemas como “O Vim-vim”, “O Pica-Pau”, “Vaca Lavandeira”, “O Sabiá e o Gavião”, contidos também na mesma obra.
[41] BOSI, Alfredo. O Ser e o Tempo da poesia, 2000, p.181.
[42] “A sátira e, mais ainda o épos revolucionário são modos de resistir dos que preferem à defesa o ataque. (...) O poeta-profeta que, em vez de voltar as costas e perder-se na evocação de idades de ouro, revela-se e fere no peito a sua circunstância”. BOSI, Alfredo. O Ser e o Tempo da poesia, 2000, p.187.
[43] Poemas como “Menino de rua”, “Melo e meladeira”, “Meu avô tinha razão e a justiça tá errada”, “Reforma agrara é assim”, “O bode de Miguel Boato e o efeito da maconha” contidos na obra de ASSARÉ, Patativa do. Aqui tem coisa, 2004.
[44] BOSI, Alfredo. O Ser e o Tempo da poesia, p.187.
[45] Idem, p.188.
[46] Ibidem, p.189.
[47] Ibidem, p.191.
[48] Ibidem, p.120

12 dezembro 2006

[Poesias] "Simplicidade" & "Sou"


Luiz Carlos Amorim


Algumas Poesias


"Simplicidade"



Gosto das coisas simples:
de um sorriso de criança,
de um rio de águas claras,
de flores, campos e praças.

Gosto de você.
De acordar com o seu beijo,
de você ser minha musa,
de dizer-lhe "eu te amo",
assim, de maneira simples,
descomplicada e sincera.

Gosto de ser menino,
arquitetar artes, zangá-la,
amar você, criatura,
fazendo as pazes depois.

Gosto de café quente,
um cigarrinho, uma pinga,
e gosto do seu sorriso
tão singelo de menina.

Não gosto de solidão.
Gosto da sua companhia,
na noite quente ou fria,
na tarde de chuva ou sol.

Não rimou?
Pois eu gosto de poesia,
seja com rima ou sem ela.
E gosto mais de você,
meu poema mais bonito...




Luiz Carlos Amorim




"SOU"


Sou assim inquieto,
irrequieto, indócil,
romântico, atrapalhado,
simples tal qual criança.
Sou um aprendiz da vida,
do amor e da esperança.
Saudade é dever de casa...
Sou qual garoto precoce,
com pressa em ser gente grande;
sou qual adulto, crescido,
desejando ser criança.
Sou poeta, amante, amado,
sou mais que eu, simplesmente;
sou tantas vidas a um tempo,
dentro e fora de mim,
que me divido em mais eus.
Sou pequenino, sozinho,
mas sou grande,
muito grande,
com alguém
a me esperar...


{Poesia] "Vem, Primavera"

Luiz Carlos Amorim


Vai embora, inverno,
leva contigo o frio,
a solidão, a saudade
e deixa vir a primavera
vestir a terra de flores,
de verde, vida e cores.

Vem, primavera:
contigo renasce a vida,
brota de novo a poesia,
renova-se a esperança.

Vem, primavera:
lança sobre nós o sol,
raio de luz, força e cor,
essência de vida de nós,
pequenos filhos da terra.

Vem, primavera:
abra sorrisos, corações,
botões e céu.
A festa da vida recomeça
e eu te festejo, primavera.

[Poesia] "Primavera"

Luiz Carlos Amorim


A primavera chegou...
O mundo vestiu-se de flores,
A vida enfeitou-se de cores,
A gente encheu-se de amores...

É primavera!
A vida sorrindo,
Música ao vento,
Poesia no ar.
É primavera!

[Poesia] "Outra Vez Primavera"

Luiz Carlos Amorim


Ele veio com a primavera,
Como um raio de sol
Passeando pelo meu jardim,
Com ramos secos no bico,
Pequeno arquiteto da natureza.

Com ele, as cores da primavera
Chegaram a minha casa,
Floriram o meu jardim,
Encheram meu coração.

E o pequeno arquiteto
Construiu o seu ninho
No meio do meu jardim,
Entre dálias e orquídeas.

Um passarinho, avoante pequenino,
Fez ninho no meu jardim.
A primavera fez morada em minha casa.
O amor fez ninho em meu coração...

[Poesia] "A Paz Que Eu Quero"

Luiz Carlos Amorim

Pra que a guerra?
Pra que revolta,
ódio, dor, ganância?
Eu quero a paz,
serenidade, amor,
quero asas povoando o céu...
Quero crianças correndo em meu caminho,
quero ouvir risos em todos os lugares,
quero sorrisos no rosto do irmão...
A paz, ah, a paz...
Não vá embora, amiga escorraçada.
Fica um pouquinho mais...
Inda há crianças por aqui,
anjos pequeninos,
brancos, negros, amarelos, pardos,
anjos que te têm nas asas,
como pássaros em liberdade
andando pelo chão
para depois voar...
Vem que eu te quero, paz.
Não deixe que eu morra pelo ódio,
não importa quando eu vá.
Quero morrer com uma flor na mão,
na outra mão um toque de criança
e nos olhos um sorriso teu...
Sorriso de vitória por estar aqui,
amiga paz, até que eu vá
e até depois que eu tenha ido...
Pois há de haver,
mesmo que eu não esteja mais aqui,
pássaros no céu, crianças pelo chão,
flores a desabrochar e corações abertos.
Paz,
teu tempo é sempre,
teu lugar é aqui!

10 dezembro 2006

[Poesia] "A Samaritana"

Na Samaria, enquanto os companheiros
foram suprir a bolsa de alimentos,
Jesus, parou de andar dias inteiros,
propôs-se repousar alguns momentos.


Sentou-se o Nazareno ao pé da fonte,
O sol brilhava em raios refulgentes.
Havia ali um poço ao pé do monte,
que Pai Jacob legara aos descendentes.


Foi a mulher samaritana ali,
para tirar da linfa deliciosa.
Ao ver de pronto, o vulto do Rabi,
ficou assim um tanto receosa.


Pois quem seria o tal desconhecido,
de tão sublime olhar, tão lindo aspecto,
que ali estava a cismar, tão recolhido,
assim tão majestosamente quieto?


O Mestre ao vê-la, deu-lhe a perceber
que tinha sede e disse, em tom bondoso:
“¾ Mulher: se queres, dá-me de beber,
pois vai o dia muito caloroso.”


Ela, mirou-o mais. Depois, por fim,
um tanto embaraçada, respondeu:
“¾ Pois como pedes de beber a mim?
Eu sou samaritana e Tu judeu ...?


“¾ Se escutasses a voz mais interior
e julgasses de modo mais profundo,
saberias que Eu sou distribuidor,
da Água da Verdade neste mundo.


E se tivesses visto o dom de Deus
e fosse tua consciência mais ativa,
saberias quem sou entre os judeus,
e tu Me pedirias Água Viva!”


“¾ Água Viva? ... Mas é tão fundo o poço,
que não podes cumprir esse desejo ...
Se a não podes tirar deste colosso,
onde tens, pois, a água, que não vejo?


Maior que Pai Jacob, és porventura?
Ele nos deu o poço no passado
e todos tem bebido com fartura,
o líquido que é sempre renovado ...”


Mas disse-lhe Jesus, todo bondade:
“¾ Quem bebe desta água, Eu te asseguro,
por mais que beba e beba a saciedade,
terá contínua sede no futuro.


Esta que Eu dou, porém, é que sacia;
e não se tira de qualquer cisterna.
Quem dela bebe, é fonte que irradia,
emana a água para a vida eterna.”


“¾ Senhor! ¾ disse a mulher ¾ dá que Tu dás
eu beberei agora alegremente.
Assim, não terei sede e terei paz
sem ter que vir aqui constantemente.


“¾ Pois vai então chamar por teu marido,
¾ disse o Rabi ¾ e vem aqui depois.
Assim, não ficará como esquecido,
e do que Eu der a ti, darei aos dois.”


Marido? ... Mas ... e um súbito rubor
roçou-lhe o rosto. Mas, com certo empenho,
algo nervosa, respondeu: “¾ Senhor!
Não poderei chamar o que não tenho.”


E, sentenciou, Jesus, profetizando:
“¾ Numa verdade pura Me disseste.
Não é teu quem contigo está morando.
Maridos ... sei que cinco já tiveste ...”


“¾ Senhor! Tu és profeta! Tu és profeta!
¾ Exclamou a mulher admirada ¾
pois como dás sentença tão correta,
sobre coisa que eu não Te disse nada?


Diz-me, então alguma coisa mais:
onde adorar a Deus? Aqui ou além?
Neste monte conforme nossos pais,
ou lá na capital, Jerusalém?”


¾ Ouve-me bem, mulher, ¾ disse o senhor ¾
Trago Comigo histórico momento.
Os que procuram luz e puro amor,
adorarão o Pai em pensamento.


Deus é o espírito da humanidade,
A mais pura e perfeita adoração,
sejam feita em Espírito e Verdade,
com um altar em cada oração.


“¾ Espera-se o Messias, bem o sei.
¾ disse a mulher, buscando assunto novo. ¾
é o Cristo que há de vir. E será Rei.
E tudo ensinará ao nosso povo.”


“¾ Por hoje ¾ Ele lhe disse ¾ vou findar
De nada mais precisas depois disto.
Procura neste momento recordar.
Eu que falo contigo ... Sou o Cristo!



Livro: Flores de Outono -Autor: Jesus Gonçalves

[Poesia] "A Prece"

Anthero de Quental


Sob o guante da treva, o Homem gemia:
- Senhor, a carne é a minha sepultura!
Por que a jornada tormentosa e escura
Em que sofro o rigor da ventania?

Padeço, errante, a imensa noite fria
De aflição, desconforto e desventura...
Alivia-me as chagas de amargura,
Socorrendo-me a senda de agonia!...

Respondeu-lhe o Senhor: - Espera e ama!
Receberás do Céu Sublime Chama
Para a angústia revel que te domina!

E deu-lhe a Prece por brilhante estrela.
Desde então, o Homem, forte e calmo, ao tê-la,
Seguiu da sombra para a Luz Divina.



Chico Xavier
(Livro – Estrelas no Chão)

[Poesia] "Ano Bom"

Auta de Souza

Hoje começa o ano. Na alegria
De nívea pomba quando nasce a aurora,
Deixa, minh’alma, a tua fantasia
Subir, cantando, pelo espaço a fora...

Deixa-a sumir-se além, rompendo gazas,
Subindo em busca de ideais queridos:
Há de trazer nas pequeninas asas
Todo o perfume dos meus dias idos!

Há de trazer o sonho transparente
Da inocência feliz (quanto eu sonhava!)
E o eco virginal da voz dolente
Que o meu sono de arcanjo acalentava.

E o meu sorriso e as minhas esperanças,
Essas ingênuas ilusões de um dia,
Toda essa luz que as almas das crianças
Num raio de luar acaricia...

Que tudo venha sobre mim cantando
O salmo doce da recordação.
Qual se pousesse um luminoso bando
De passarinhos no meu coração
...

[Poesia] "Alegria de Servir"

Olhar de carinho e de paz,
Que a todos acalma e refaz.
Das lutas e das dores da vida,
Ninguém saía sem uma palavra amiga.

Transmitia a alegria que sentia,
De poder servir e ajudar.
Via em cada ser um irmão e um cultivador,
Que ontem plantou e hoje tem que ceifar.

Sabia que a imperfeição é transitória,
E tudo fazia para que a paz fosse vitoriosa.
Com palavras de esperança sempre soerguia,
Aquele irmão que na estrada caía.

Esse cultivador de cândido olhar,
de sementes de amor sempre a espalhar.
A todos sorrindo, sempre a ajudar,
de operosa existência, sempre a trabalhar.

Verdadeiro exemplo a ser seguido,
Cumpriu com louvor a sua missão.
Levou o amor e a paz ao mundo,
Com o seu coração de criança.

Genuíno discípulo do Cristo,
Que pelo exemplo edificou as almas.
Cheio de luz e de amor,
Chico sempre foi um benfeitor.

Como ninguém soube pelo exemplo ensinar,
que a vida é semeadura que nos compete realizar
Plantando sempre o amor e a esperança
conseguiu deixar em todos sua lembrança.

Viva o Chico,
Todos gritam na espiritualidade.
Pela volta à verdadeira pátria,
De quem foi servidor de verdade.

Servidor fiel da caridade de Jesus.


Grupo Espírita Fraternidade de Mogi das Cruzes.
Um amigo oculto.

[Poesia] "Agitação"

Nosso irmão Silva Teixeira
Pediu-nos fraternalmente
Dar-lhe atenção e assistência
Na viagem que faria em visita ao pai doente.

Não vacilamos no assunto,
Fui ao nosso diretor:
- “Algum apoio ao amigo?
Vai, sim!... – nos disse o mentor.”

Encontrei-me com Teixeira
Junto à esposa Dona Alcina,
Num ônibus que largava.
Vencendo a chuva mofina.

A máquina em movimento
Formava rajadas frias...
A viagem do casal
Seria apenas dois dias.

Às onze da noite em ponto,
Com biscoitos a granel,
A dupla desceu, entrando
Em velho e pequeno hotel.

A luz se fez no aposento
Que lhes fora reservado...
Acomodaram-se os dois,
Deitando-se, lado a lado.

Instantes depois, um grito
Ressoava estranho e feio...
Dona Alcina retirara
Uma barata do seio.

Teixeira não descansou,
Pois a esposa reclamava,
Xingando a roupa do hotel,
Em pranto se lastimava.

No outro dia, Teixeira
Observou, tristemente,
A morte rondando a casa
Na face do pai doente.

À noite, foi novo trampo;
Dona Alcina, num berreiro,
Clamava que muitas pulgas
Mordiam-lhe o corpo inteiro...

Gritava, humilhando o esposo:
- “Não tens o berço que julgas,
Esta casa em que nasceste
É um pardieiro de pulgas...”

Manhã seguinte, o irmão Silva
Encomendou condução,
Voltariam para casa,
Sem qualquer baldeação.

Chegaram ao lar, à noite;
Dona Alcina, muito ativa,
Falava: - “Agora estou salva!
Agora, sim, estou viva...

Nem pulgas e nem baratas,
Quero somente o que é meu,
Bendita seja esta casa,
A casa que Deus me deu...

Meu sogro? Que Deus o cure,
Não tomarei nova estrada,
Desejo a paz do meu canto...
Tranqüilidade e mais nada.”

Mas passadas duas horas,
A pobre rolou no chão,
Seguindo para o hospital,
Picada de escorpião!...

Jair Presente
Livro: Ponto De Encontro
(Psicografia Francisco Cândido Xavier)

[Poesia] "Abençoa Senhor"

Auta de Souza


Abençoa, Senhor esta Casa singela,
Onde a luz do Evangelho esplende, soberana,
E onde encontra guarida a imensa caravana
Dos tristes corações que a prova desmantela.

Neste pouso de paz onde a fé nos irmana,
Em torno do ideal que ao mundo se revela,
A Caridade é sempre atenta sentinela,
Estendendo os seus braços à penúria humana.

Neste recanto amigo, à margem do caminho,
Ninguém procura em vão o conforto e o carinho,
Cansado de bater, chorando, porta em porta...

Porquanto a Tua voz na voz de quem ensina,
A mensagem de amor da Celeste Doutrina,
A renovar no bem a vida nos exorta!...

[Poesia] "A espera"

Eliza Desidério César Bento
(Campinas, 6 de agosto de 2001)

Em lembrança de minha mãe Solange
A espera é constante
É excitante
É radiante
A espera de alguém que não chega
A espera de um amor
A espera da chegada
A espera de sua noiva
Sua mais nova companheira
A espera de sua no vida
A espera de nove meses
É a espera mais pura e mais bela da felicidade
É a espera do milagre da vida
Só que tem a espera mais triste do mundo
A espera do descanso eterno
Pode ser numa cama
Pode ser numa cadeira de rodas
Pode ser até em uma felicidade
Lá naquele quarto alguém espera seu
Descanso eterno
Pessoas choram no corredor desesperadamente
Na espera de um milagre eterno.

[Soneto] "Amor e humildade"

Nós viveremos, universo em fora,
Trazendo dentro d’alma a vida acesa
No ritmo da luz da Natureza,
Que é a eterna vibração da eterna autora.
A dor, somente a dor nos aprimora,
Nos caminhos da prova e da aspereza,
Elevando a nossa alma na grandeza
Da grande claridade redentora.


Somos os lutadores peregrinos,
Sonhando pela estrada dos destinos,
Um castelo de paz, ventura e glórias.
Sabemos do passado envolto em ruínas
Que a luz do amor e as rudes disciplinas,
São as chaves das últimas vitórias.

Raul de Leoni
(Soneto psicografado por Chico Xavier em 1936)

[Poesia] "Sertaneja"

Triste,
Magra,
Solitária,
Acompanhada apenas pela fome e a dor.

Mulher frágil mas forte
No seu chorar,
no seu avançar,
Pela estrada poeirenta.

Seus pés descalços,
Rachados,
são como o solo estorricado,
sem verde.

Você tem raízes nos pés.
Nas veias altas,
As pernas marcadas,


Mas o ventre sempre fértil,
a desafiar a fome.
Você olha o céu sem nuvens
E traz nuvens no seu olhar.

Maltrapilha,
Com braços finos mas fortes,
Bastantes para embalar
Seus filhos na rede,

No colo,
junto ao coração que teima em esperar
A chuva
A água amanhã

Nas lutas da sua vida,
Mulher destemida e sofrida,
Eu admiro a sua força.

Mulher mãe.
Cidadã da fome e da dor,
Que coloca seus filhos no mundo
E com suas mãos tece a cruz,

Ao devolvê-los ao berço-terra,
Na cruz da sua dor.
Eu louvo suas lutas inglórias,
Mas um dia lhe será concedida


A alegria de mergulhar as mãos
Na água pura
Que a alma liberta se inunda de luz,
Matar sua sede de amor,

Num amor maior.
Sacrifício ainda lhe pedem,
E nos seus olhos tristes,
Você agradece as migalhas

Que lhe chegam dos que muito possuem.
Você ama,
Você perdoa
O solo ingrato

E ainda sente
Gratidão e amor.
Sertaneja, Imagem da dor,
Que lhe abençoe nosso senhor.


Cecília Meireles
Mensagem recebida por Shyrlene Soares Campos, no núcleo Servos Maria de Nazaré, dia 25/09/1999.

07 dezembro 2006

Em Cada Sentimento Meu

de Roger Jones

Em cada sentimento meu...
Tem um espírito ateu...
E uma alma reencarnada...
Um orgulho plebeu...
E uma nobreza calada...
Uma certeza nítida...
Em eterna dúvida...
Um cruel bandido...
E um anjo perdido...
Um livro aberto...
E um segredo guardado...
Um futuro incerto...
Num instante passado...
Um destino certo...
E um projeto abandonado...
Em cada sentimento meu...
Tem um sentido...
E um rumo inexistente...
Um desejo contido...
E um medo persistente...
Uma vontade que desiste...
E uma esperança que existe...
Um desencanto...
E um contentamento...
Um amigo santo...
E um demônio atento...
Uma inteligência sólida...
E ingenuidade...
Uma demência mórbida...
E serenidade...
Em cada sentimento meu...
Tem uma contradição...
E uma lógica sem chão...
Um desânimo juvenil...
E um desabafo senil...
Uma harmonia...
Em confusão...
Uma agonia...
E uma razão...
Um colapso vulcânico...
E a calma de um lago...
Um pânico...
E um afago...
Um verso doce e amargo...
Que se intrometeu...
Em cada sentimento meu...

Timedez

de Cecília Meireles

Basta-me um pequeno gesto,
feito de longe e de leve,
para que venhas comigo
e eu para sempre te leve...
- mas só esse eu não farei.

Uma palavra caída
das montanhas dos instantes
desmancha todos os mares
e une as terras mais distantes...
- palavra que não direi.

Para que tu me adivinhes,
entre os ventos taciturnos,
apago meus pensamentos,
ponho vestidos noturnos,
- que amargamente inventei.

E, enquanto não me descobres,
os mundos vão navegando
nos ares certos do tempo,
até não se sabe quando...
- e um dia eu me acabarei.

01 dezembro 2006

Operação Prato

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